O LUGAR DO TREINO DE FORÇA
POR FREDERICO ABREU
Durante décadas o treino de força (treino com resistências, musculação) tem sido o parente pobre da prescrição de exercício em todas as suas vertentes. No que diz respeito aos ganhos de força e massa muscular – hipertrofia – a profissão continua a basear-se em larga escala nos relatos provenientes da experiência no terreno. Reproduzem-se dogmas e esquemas na esperança de que produzam os resultados vistos nos ídolos ou referências de desportos como o culturismo. No âmbito da saúde a realidade não é diferente, apenas já bem dentro dos anos 2000 a ACSM passou a recomendar o exercício de fortalecimento muscular no planeamento semanal (apesar de já reconhecer a sua potencial importância anteriormente). Pois hoje, a realidade é diferente. Hoje, numa população extremamente envelhecida, as caminhadas já não são suficientes.
No Brasil, nosso país irmão, o profissional de exercício é já considerado em algumas especialidades um profissional de saúde. Existem, inclusivamente, ginásios quase exclusivamente com aparelhos de treino de força montados em Hospitais Públicos (e.g. Hospital das Clínicas). Abre-se aqui a porta para podermos testar, enquanto comunidade científica, a possibilidade do exercício (treino de força neste caso) ser não só protetor, mas um “medicamento” para várias patologias – Exercise is Medicine™ está já em 6º lugar no top das tendências do mercado de fitness para 2020 ACSM .
A esse propósito, um recente estudo de caso desenvolvido por Seguro et al (2019) mostra a evolução/recuperação de uma senhora idosa com uma abordagem de dose mínima de treino de força. Um plano de 2 séries de 4 exercícios, replicada 2 vezes por semana (40min de treino semanal) provocou melhorias drásticas na qualidade de vida, perfil cardiometabólico, diminuição da polimedicação e outros. O treino de força, neste caso, substituiu muitos medicamentos ao mesmo ritmo que permitiu uma melhoria demasiado evidente da função física e desempenho das atividades de vida diárias. E isto com apenas 40 minutos de treino semanal, quando aquilo que é pedido no que diz respeito ao treino aeróbio é uma atividade de 150 a 300 minutos/semana.
A visão do treino de força como um medicamento que diminui factores de risco e probabilidades de eventos cardiovasculares (Yang et al 2019); uma ampola que melhora a qualidade de vida ou reduz as dores lombares de forma tão ou mais eficaz do que os exercícios de Pilates; um comprimido que aumenta a força e a massa muscular, traz-nos para outra dimensão – qual a quantidade mais eficaz? Qualquer medicamento ou suplemento tem potencialmente uma determinada dose que passa a ser tóxica para o nosso organismo. Se é verdade que na relação entre o treino aeróbio e a saúde esse limite (no caso de existir) é muito mais ténue, no que se refere ao treino de força e os seus resultados parece que encontramos esse teto de dose máxima bastante mais perto.
Quando pensamos no treino de força e o seu papel no fitness, imaginamos aí um fim dedicado à composição corporal (aumento da massa muscular ou perda de massa gorda) ou à performance (aumento dos níveis de força). A toxicidade deste medicamento que é o treino com resistências neste campo reflete-se através da diminuição progressiva dos ganhos quando ultrapassamos a dose máxima. Os ganhos existem, apenas entram em declínio. E o limite é individual, mas real. Será que não estaremos a induzir em erro os nossos clientes e alunos quando lhes pedimos a quantidade ideal de exercício para o seu objetivo? Não será que estaremos a debater pormenores quase supérfluos do treino quando passamos ao lado da variável que de facto importa – a intensidade de esforço?
São várias as questões para as quais precisamos de resposta. Não temos dados certos, mas temos bons intervalos para nos poder balizar, e infelizmente estamos por vezes muito fora daquilo que é ideal. O treino aeróbio tem do seu lado a vantagem da praticabilidade da prescrição na vertente da saúde, o que esbarra na dificuldade que é ter um treino de força acompanhado para a maioria da população. Parte de nós ter o conhecimento que nos permita ser o mais eficiente e eficaz possível na obtenção dos resultados pretendidos, conseguindo assim chegar ao máximo de pessoas possível com os menores custos (financeiros, temporais e até motivacionais). Enquanto profissionais do exercício, podemos fazer mais e melhor.
Autor:
FREDERICO ABREU
PROMOFITNESS- Mestrado em Gestão do Desporto – Organizações Desportivas | Universidade Técnica de Lisboa (UTL)/ Faculdade de Motricidade Humana (FMH) / Instituto Superior de Gestão e Economia (ISEG);
- Licenciatura em Ciências do Desporto – Ramo Educação Física e Desporto Escolar na Faculdade de Motricidade Humana da Universidade Técnica de Lisboa;
- Diretor Técnico e Coordenador PT + Aulas de Grupo Indice Gym;
- Profissional Certificado Go4Training;
- Tutor/Orientador de Estágios do Curso de Técnico Especialista em Exercício Físico;
- Autor Especialista Gym Factory
- Especialista/Palestrante – Treino na Gravidez e Pós-Parto – Índice Gym | Mamãs e Bebés